Um
texto interessante retratando o pensamento de uma mãe de uma criança
autista. Este texto foi escrito por Maria
Rosa Fardoski no
grupo do Facebook “Mães de crianças com autismo.
Gentilmente, Maria Rosa permitiu a reprodução do texto neste blog.
O
AUTISMO ATRÁS DA PORTA
-Boa
tarde, Márcia! Oi João Pedro, vamos lá? Hoje a tia vai fazer uma
brincadeira super legal!”
A
porta é fechada. A sessão do Pedro com a T.O. começa.
Márcia
é a mãe do autista na recepção da clínica, Pedro é a criança
autista dentro da sala.
Dentro
do consultório a terapeuta trabalha com o Pedro. Os jogos, os
desafios, muita coisa a aprender. Esse é o autismo lá dentro.
Do
outro lado da porta a Márcia abre a revista Caras e passa as páginas
sem ler um parágrafo sequer. Seu pensamento está dentro da sala.
Seu pensamento está no futuro incerto do Pedro. Esse é o autismo do
outro lado da porta. Esse é o autismo sem atendimento.
Quantas
vezes ali do outro lado da porta a Márcia chorou? Quantas vezes ela
pensou: como vou pagar a terapia deste mês? Será que meus outros
filhos já fizeram o dever de casa hoje? Será que o Pedro algum dia
fará um dever de casa? Será que o Pedro vai dormir hoje à noite?
Se ele dormisse… seria bom ter esse tempo com meu marido.
Mas
o dia seguinte vem e as forças da Márcia se renovam no sorriso do
Pedro. Essa é a sua terapia…vê-lo sorrir!
Márcia
precisa ser forte, ela sabe. A sociedade não perdoa as birras do
Pedro. O marido não perdoa a bagunça da casa. A vizinha de baixo
não perdoa o barulho das passadas firmes do Pedro no meio da
madrugada. A sogra não perdoa porque os “genes defeituosos” não
vieram da família dela. A amiga de infância da Márcia não perdoa
porque a Márcia precisa sempre desligar o telefone quando a conversa
está ficando boa. MÁRCIA, A IMPERDOÁVEL!
…
Tem
Márcia que chora, tem Márcia que ri pra não chorar.
Tem
Márcia que ama o Pedro, tem Márcia que ama a Gabriela, tem Márcia
que ama o Lucas, tem Márcia que ama a Stella.
Tem
Márcia pra tudo. Tem Márcia pra dieta, tem Márcia pra Sonrise. Tem
Márcia no workshop da ABA, tem Márcia no protesto da Esplanada.
Tem
Márcia que tem um Pedro, mas não foi ela quem o pariu. Tem Márcia
que ninguém sabe, ninguém viu!
Tem
Márcia com o filho encarcerado, tem Márcia com o filho incluído.
Tem Márcia que o filho está num ambiente escolar fingido. Finge que
aceita, finge que inclui, finge que aplica. E a Márcia não suporta
mais fingir que acredita.
Tem
Pedro de tudo quanto é jeito, Pedro grave, Pedro leve. Pedro que
dança, Pedro que representa. Tem Pedro que poderia aprender, mas ele
não senta.
Márcia
que largou a carreira profissional. Márcia que trabalha com a cabeça
lá no Pedro!
Tem
mil realidades da Márcia. Tem mil realidades do Pedro.
Márcia
é você, Márcia sou eu.
Que
precisa da manicure e da massagem que te cure. Que precisa desabafar
e se cuidar. Márcias que precisam de condições pra trabalhar.
Márcia
é missão que não acaba. Márcia trava a batalha diária e a vence
todos os dias, pois todo dia é dia de vencer. Pedro é a criança
diferente. Pedro é muito além da gente. Pedro é muita areia pro
caminhãozinho dessa sociedade. Pedro é arretado, Pedro é
barbaridade!
Pedro
não precisa de pena. Pedro precisa da ciência a seu favor. Pedro
não precisa ser contido e sim que encontrem a origem de sua dor.
Levanta
a cabeça Márcia, mesmo que ninguém venha a te cuidar. Acorda
Márcia… acorda que a irmandade é azul e tem quem queira te
abraçar.
O
autismo do lado de cá da porta é bem difícil de levar. Mas você
não pode parar, na fé, na força e no sorriso do teu Pedro…
Sorria
Márcia, sorria!
(Essa
é uma história “fictícia”, qualquer semelhança entre nomes e
fatos terá sido mera coincidência!)
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